terça-feira, 2 de novembro de 2010

A Musica do Dia - La Muerte Chiquita - Cafe Cacvba


Romoaldo de Souza

A primeira vez que velei um corpo foi do marido de uma tia. Era um tio torto, como se diz no interior de Pernambuco. Luiz Henrique. Homem endinheirado, muitas vacas - magras - mas era muitas. Carros de boi, empregados, amigos e filhos que não acabavam mais. Morreu! Fomos todos velar, Luiz Henrique. O padre, o prefeito, um deputado estadual e algumas pessoas que nem sei de onde saíram. Velório de gente endinheirada é sempre assim. Cheio de gente!


Café. Luiz Henrique gostava de tomar café. Era da pior espécie. O café, claro! Mas o povo se esbaldava de tanto tomar café. Café e pinga. Era uma lapida aqui, outra ali. E mais pinga, mais café e de repente me vejo numa roda de pessoas rindo que era uma beleza!


Achei esquisito aquele quadro surreal. Minha tia, os filhos choravam nas camarinhas. Mas meu tio contava histórias e todo mundo ria. E vinha uma piada. Um "causo" e era aquela gargalhada. Corri para perguntar a meu avô o que fazer. Se ficava com minha tia e chorava com ela ou se ia para o lado dos que sorriam a torto e a direito.


- Decida-se! Fique onde você acha que representa a vida. Que sentimento você tem pelo velho Luiz Henrique? Se são boas as recordações, melhor sorrir. Ele vai estar alegre - disse meu avô que tinha tradições diferentes dos pernambucanos para falar da morte.


Pronto. Achei mais animado ouvir piadas. Meu tio, o contador de histórias, ainda pediu para eu não ficar por ali, por causa das histórias "pesadas". Chegamos a um acordo que eu ficaria e que o nível subiria um pouco. Eu ainda estava na fase de pensar que piada pesada era de jumento carregado com seus caçuás. Esta é a primeira lembrança que me vem à mente de um velório. Fiquei na parte alegre.


Tempos depois, fui estudar no México. E me lembro que a primeira carta que mandei de lá foi para meu avô, contando a ele como era o "Día de los Muertos" na Cidade do México. Eu morava numa ruazinha, próximo à Calle Don Diego de León. Por volta das 7 da noite, começaram uma distribuição de algodão-doce, balas, caveiras de chocolate e iguarias que me lembrei da minha infância, na festa de Cosme e Damião. Confeitos, jujubas, doces de tudo quanto é espécie.


Caveiras de chocolate são distribuídas às crianças.
A festa dos mortos, no México faz a gente lembrar mais
da vida que se estivéssemos chorando por quem morreu

Parei e fui convidado a entrar na casa de Dueña Lurdes. Uma senhora tipicamente mexicana. Excelente cozinheira, mãe de duas filhas. Oh, mexicaninhas bonitas. Lembro bem o nome de uma delas… Mais tarde descobri que estava trabalhando na Cáritas da Alemanha. Danou-se! Era longe demais para quem tinha apenas curiosidade. Bom, voltando à festa da casa de Dueña Lurdes. Achei diferente ela se apresentar assim.


- Holla chico. Soy Dueña Lurdes. Mi hija Hilda Carrero. Fatima! Faaaaatima! - Gritou! Não sei mais o que rolou naquela festa.


O México comemora o Dia de Finados diferente das tradições cristãs do restante da América. Os mexicanos misturam as devoções com ritos culturalmente trazidos dos antepassados. Dos índios. É festa com ironia. Quase um carnaval. Toalhas bordadas, incenso, comidas - a maioria doce - e muita bebida. E tome tequila, cerveja.


No altar, os mexicanos como Dueña Lurdes, colocam esqueletos de chocolate, a imagem da Virgem de Guadalupe - a padroeira dos mexicanos - fotos de amigos e parentes mortos… E tome tequila.


Nos altares, fotos de parentes e amigos mortos.
Objetos de recordação, incenso, comida e muita bebida

Ouvi pouco choro. Eu também não choro mortos. Prefiro comemorar com os vivos. Aprendi com meu avô que trouxe essa tradição dos ciganos do Leste Europeu.


Bom, para terminar, achei essa música do grupo mexicano Café Tacvba. La Muerte Chiquita. Ah, o Tacvba é assim mesmo, com vê. É que no centro da Cidade do México tem uma tradicional cafeteira "Café Tacuba" que não aceitou que o nome do grupo musical tivesse o mesmo nome.


Bom dia! Comemore a vida!


La Muerte Chiquita

Café Cacvba


Dame la muerte chiquita

dame la muerte pequeña
y así tal vez en tus brazos
alcanzaré gracia plena
su esencia de alta marea
sus besos de tamarindo
sus pestañas dos palmeras a cuyo vaivén me rindo
dicen que usted trae las sombras
y por dentro está toda herida
Dame la muerte chiquita
antes del último sueño
una cosa a Dios yo pido
un segundo ser su dueño
la venganza es cosa dulce
y este machete que tengo
es por si alguien le hizo daño
que yo por usted me muero
es por si alguien le hizo daño
que yo por usted...
Dicen que usted trae las sombras
y por dentro está toda herida
por una noche en su lechoz de dar la vida



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