segunda-feira, 11 de abril de 2011

Apenas um Almoço ...


Ricardo Icassatti Hermano

Era apenas um almoço. Em um restaurante bastante frequentado por pessoal de escritórios. Preço bom, comida boa. Excelente combinação. Logo se tornou o preferido da galera executiva. Ele comia ali muito antes de atingir esse status. Para ele, foi uma mudança até legal. Muita gente nova e bonita passou a frequentar o local.

Ele sentou-se à mesa de costume e o garçom até já sabia o prato que seria pedido. Fez o pedido e se jogou em seus pensamentos. O olhar fixo num horizonte interno, enquanto flutuava entre as imagens, ideias e sentimentos que moravam em sua mente. Ficou assim por um tempo que não saberia contar. Até que algo, um movimento suave, o tirou daquele estado meditativo.

Era um grupo de três moças que haviam acabado de chegar e se sentar numa mesa em frente. Ele olhou com a displicência de quem está acordando e seus olhos encontraram os olhos de uma das moças. Ela vinha olhando para ele desde que entrara no restaurante. Talvez tenha estranhado aquele olhar perdido no espaço, ou percebido a profundeza em que se encontrava aquele homem e tenha ficado intrigada. Mulheres são felinamente curiosas.

No decorrer do almoço, ele tentou não olhar muito para a mesa em frente, onde as moças conversavam baixinho e riam alto. Mas, aquela moça trajava um vestido desses com um rasgo na lateral e a sua coxa estava totalmente visível. Mas, não era isso que insistia em atrair o seu olhar. Era simplesmente a beleza facial da moça. Especialmente quando sorria. Ela também tentava não olhar diretamente para ele, mas era algo inevitável. Os olhares se esbarravam a todo momento.

Ele resolveu manter o foco no almoço. Mas, sabe como é. Ela resolveu mais ou menos o problema dela, prestando atenção numa das amigas que falava pelos cotovelos e, pelas risadas, deviam ser estórias bem engraçadas. Bom para ele, porque ela sorria o tempo todo. Olhando para a amiga, podia olhar também para ele, meio de lado. Claro que ele percebeu a manobra e se aproveitou da situação passando a olhar muito mais para ela, que sequer piscava.

Findo o almoço, ele pagou a conta, levantou-se e foi em direção à mesa das moças no momento em que o garçom servia cafés Nespresso. Virou e foi passando atrás da moça bonita, que já estava aflita, sem saber o que fazer. Ele percebeu o nervosismo geral na mesa. Deve inclusive ter sido tema de alguma daquelas conversas. Ele parou ao lado dela e perguntou:

- O que vocês acham desse café?

Elas sorriram nervosas por um momento, olharam para ele e falaram todas ao mesmo tempo. "É bom", "É isso", "É aquilo", "Não sei", "Mais ou menos".

Ele olhou diretamente para a moça bonita.

- O que você acha? É bom? É ruim? É mais ou menos?

Ela finalmente pôde olhar diretamente nos olhos dele sem se sentir constrangida.

- Eu acho um pouco forte demais. Por isso que eu sempre peço esse mais fraquinho.

- Mas, o gosto é bom pra você?

As outras meninas se calaram automaticamente e acompanhavam cada palavra dita, cada gesto, como se fosse um jogo de tênis. Ora olhavam para ele, ora olhavam para ela.

- É um pouco amargo.

- Porque esse não é um bom café. Deixe-me explicar. Sou barista e provador de café. Tenho acompanhado a evolução da Nespresso no Brasil e tenho notado que as pessoas enjoam rapidamente desse tipo de café.

- Realmente, já está ficando meio enjoativo. Mas, não tem outro, né? Todos os restaurantes estão servindo esse café.

- Eu tenho um blog onde escrevo sobre café, cultura, política e outras coisas. Estou numa campanha para que os restaurantes sirvam cafés melhores. Afinal de contas, o Brasil é o maior produtor e planta alguns dos melhores cafés do mundo.

- É, bem que eles poderiam servir um café melhorzinho.

- Obrigado pela atenção e pela opinião de vocês. Puxa ... sou muito mal-educado mesmo. Meu nome é Tony.

- O meu é ...

- Por favor, não me diga o seu nome.

- Por que?

- Se voltarmos a nos encontrar casualmente por mais duas vezes vezes, eu vou querer saber o seu nome.

Ela então abriu o sorriso mais lindo e luminoso que ele já havia visto em toda a sua vida. As outras moças puderam soltar o suspiro que estava preso há algum tempo. Ele saiu do restaurante deixando tudo nas mãos do destino. Pelo menos sabia onde iria almoçar toda terça-feira e que precisava manter geladeira e despensa abastecidas.

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