terça-feira, 12 de julho de 2011

Morte na Esplanada - Capítulo 12


Ricardo Icassatti Hermano

Escrever essa Blog-Novela tem me levado a fazer algumas reflexões. O estilo narrativo - sim, a novela é um estilo literário, regido por normas e preceitos, desde o século XVIII -, ou a literatura em geral e, se quisermos ampliar, até mesmo a arte em todas as suas formas, é uma espécie de surto psicótico. Eu chorei quando vi o quadro "Noite Estrelada" de Van Gogh no Metropolitan Museum of Art em Nova Iorque.

No momento em que escrevo, toda aquela ação realmente aconteceu, aqueles personagens realmente existem e até os sons, cheiros, cores, texturas. Exatamente como num surto psicótico, quando o esquizofrênico ou quem sofre de psicose, imagina um enredo que é real para ele, mas que só existe e faz sentido em sua imaginação.

Eu preciso fazer força para imaginar. O surtado não. A diferença é que consigo mergulhar num mundo imaginário e sair dele ileso, pois não perdi a perspectiva da "realidade". O surtado mergulha e não percebe mais, pois perdeu a capacidade de diferenciar o que é "realidade" e o que é "imaginação".

O mesmo acontece quando o leitor "mergulha" na novela ou outra obra de arte. Ele beira o surto psicótico, pois para tirar prazer da leitura - ou no caso das telenovelas, do que vê - precisa "acreditar" naquela narrativa e, de certa forma, deixá-la dominar os sentidos. Reparem na reação de pessoas que agridem atores e atrizes que interpretam vilões.

Mas, são apenas reflexões. E observar essa "esquizofrenia psicótica criativa" - das(os) leitoras(es) e minha - em ação, é um dos motivos porque escrever essa Blog-Novela tem me dado tanto prazer. E volto a frisar que é tudo ficção, produto da imaginação. Apesar da realidade estar aí nos surpreendendo todos os dias e mostrando que pode ser bem pior ou mais patética que a ficção.

E as nossas leitoras estão engajadas e colaborando muito para criarmos as características físicas do delegado Alexandre Dantas. Fazendo uma média de todas as sugestões e somadas às habilidades mencionadas nos capítulos anteriores, ele ficou mais ou menos parecido com o George Clooney ... hahahahahahaha!

O delegado está entre 35 e 40 anos de idade. Não faz o tipo herói fortão, mas também não é um sujeito desprovido de músculos. Digamos que está em boa forma, pois treina artes marciais regularmente. Não é muito alto, ficando em 1,71m. É moreno e seus cabelos estão acinzentados. Quase sempre está com uma barba rala por falta de tempo para se barbear. Veste-se de maneira casual.

Agora, surtem com mais um capítulo de "Morte na Esplanada", a mais alucinante Blog-Novela da internet. Não sem antes preparar a sua caneca de algo deliciosamente quente, vestir seu pijama de flanela ou seda vermelha, entrar debaixo do edredon e ligar o som do computador. Porque você não é doida(o) de perder toda essa diversão! Abaixo, a trilha sonora de hoje.




Morte na Esplanada

Capítulo 12

O capítulo anterior terminou com a entrada da jornalista Mércia Trancoso no escritório do delegado Alexandre Dantas. A equipe ficou toda surpresa. O clima ficou tenso.

- Bom dia delegado Alexandre. Meu nome é Mércia Trancoso, do jornal Notícias do Brasil - apresentou-se a repórter com olhar lânguido e estendendo a mão. Ela vestia a mesma blusa de seda cor de rosa clara.

Alexandre ficou estático por dois segundos, mas logo recuperou a consciência. A jornalista, claro, percebeu. Ela era uma predadora e tinha muita sensibilidade para a movimentação das suas presas. Ela também era famosa na cidade pelos métodos, digamos, heterodoxos que utilizava para conseguir informações exclusivas. Parte deles, o delegado havia visto na noite anterior.

Apesar de não ser uma beleza estonteante, e repórter não era feia e tinha um belíssimo corpo do tipo mignon de pele dourada coberta por uma quase imperceptível penugem incolor. Somando isso a uma sensualidade planejada nos mínimos detalhes, era possível deduzir que burra também não era. E ela sabia usar seus dotes como poucas mulheres conseguiriam entender.

Desde criança, Mércia percebeu que a moral era uma convenção social que impedia seus planos e sonhos de sucesso. Seus pais se esforçaram para mantê-la em um colégio de freiras e fornecer a melhor educação disponível. Várias vezes foram chamados para conversarem com a Madre diretora e tentar demovê-la da ideia de expulsar a filha da escola.

A conversa sempre terminava com polpudas doações a alguma "obra de caridade" das prestimosas freiras. Para Mércia, sobravam os castigos habituais: ajudar nas missas, penitências, tarefas extenuantes e alguns tabefes, puxões de orelha e de cabelo das misericordiosas freiras. Foi ajudando o padre nas missas que ela conheceu mais sobre o poder que exercia sobre os homens. Ali na sacristia, ela aprendeu a beber vinho e satisfazer a luxúria alheia. Foi uma verdadeira universidade da vida.

Mércia nunca se sentiu uma vítima ou sequer ameaçada pelo inferno de história em quadrinho prometido se contase aos pais o que acontecia no sacristia. Ao contrário, apreciava a tensão causada pela culpa alheia e pela ideia do pecado. Ela entendeu logo quem estava no comando, quem tinha o poder real e como tirar vantagem disso. Dali em diante, sua vida escolar foi um sucesso até a universidade de Jornalismo.

Inteligente e objetiva, ela aprendeu rapidamente o essencial e viu que o restante do curso era uma perda de tempo. Professores e professoras lhe deram o diploma de presente em troca da realização das fantasias eróticas mais bizarras. Não se deu nem ao trabalho de participar da festa de formatura. Dois anos antes de terminar o curso, já trabalhava num jornal local. Levou para o mundo profissional todo o seu talento para observar, avaliar, satisfazer e conquistar suas presas. Tornou-se uma predadora temida e muito desejada. Se auto-classificou como bissexual.

Na sua busca incansável pelo sucesso, Mércia apelava um bocado para a mentira. Quase sempre dava certo porque os envolvidos tinham segredos que ela poderia usar e se calavam. Mas, às vezes, por erro de cálculo ou excesso de confiança, suas mentiras lhe custavam alguns dissabores, como ter matérias desmentidas publicamente. Ela não dava a mínima para a execração dos colegas, especialmente quando vinha das mulheres.

Mas, no final, isso parecia até aumentar sua fama e a quantidade de gente disposta a correr riscos com ela. A prova disso era a coleção de chefes e editores com quem se casou e separou após conseguir o que queria. A cada degrau profissional que galgou, um deles ficou destroçado no degrau abaixo. Muitos deles até abandonaram a profissão de tanto desgosto. E ela seguia impune com suas mini saias, saltos altos, pernas perfeitas, batom vermelho e blusas transparentes.

Ali, de perto, Alexandre viu que os olhos da repórter não eram negros como pareciam no vídeo. Seus olhos eram cor de mel. E eram hipnotizantes.

- Pois não Mércia. O que você deseja? - Alexandre saiu da sua mesa, se dirigiu até a porta e a fechou. Do lado de fora, a curiosidade corroía os demais integrantes da equipe.

- Você é o encarregado da investigação sobre o assassinato da ministra Sueli Sandoval, não?

- Sim, mas não posso falar sobre isso com a imprensa.

- Eu sei, delegado, que existem certas dificuldades e impedimentos quanto à imprensa. Mas, você entende que o meu trabalho é conseguir informação, né?

- Eu sei ...

- Pois então, talvez pudéssemos encontrar um meio de contornar essas dificuldades e impedimentos ... poderíamos conversar em off e eu manteria a minha fonte em segredo.

- Não, você não faz ideia do que sejam esses impedimentos. É a minha carreira que está em jogo.

- Você pode confiar em mim, esse segredo seria só nosso - subitamente a voz de Mércia assumiu um tom mais grave, suave, aveludado, intimista.

- Só o fato de você estar aqui já vai me causar problemas.

- Alexandre, eu trabalho num grande jornal, as pressões são terríveis. Os editores exigem furos quase todo dia. Esse caso tem gerado muita apreensão entre os veículos. Todos querem dar alguma notícia exclusiva e bombástica. Não sei porque me escalaram para esse caso. Tudo bem que eu cubro política, mas isso seria mais da área de polícia. Tenho sido muito cobrada e ... - os lábios tremeram e os olhos de Mércia se encheram de água. Ela desviou o olhar e colocou a mão direita sobre a boca.

Alexandre apertou os olhos e pensou: "Essa mulher é boa mesmo nisso, que performance. Merecia um Oscar". Quando ela se recobrou e virou para frente, o delegado não pôde deixar de notar que a blusa estava com mais um botão aberto. Esse movimento ele não percebeu. "Putz! A mulher é rápida!". O panorama era fantástico, mas ele sabia que aquilo era intencional. Ela não limpou as lágrimas que desciam deixando um rastro negro pelo rosto e lhe dava uma aparência bastante sexy.

- Eu juro, Alexandre, que jamais vou revelar o seu nome em qualquer matéria sobre esse caso. Para mim, o segredo é vital para mantermos uma relação de confiança, você e eu ... - disse enquanto se levantava da cadeira e apoiava as duas mãos sobre a mesa, deixando um pouco mais do seu corpo à mostra.

Uma mulher linda, fragilizada e disponível. Como Humphrey Bogart em"Relíquia Macabra" (ou "The Maltese Falcon", 1941), ele não iria cair naquela esparrela. Imediatamente se levantou, foi até a porta, abriu - provocando uma correria do outro lado - e se despediu da repórter.

- Obrigado por ter vindo e sucesso na sua matéria. Aconselho a procurar o nosso diretor. Ele é o único autorizado a falar sobre o caso com a imprensa. Passar bem.

Os olhos suplicantes de Mércia se encheram de ódio. Menos pela recusa de Alexandre em dar as informações que ela queria e mais por não ter conseguido seduzir aquele "delegadozinho de merda", gritou em pensamento. "Como ele conseguiu resistir aos meus encantos?", se perguntava enquanto saía da sala e se dirigia lentamente ao saguão dos elevadores. Pescoços viraram. Ela pensava com seus botões que desabotoam tão facilmente: "Ele não perde por esperar ..."

Enquanto isso, a equipe se recompunha fingindo estar trabalhando na papelada. Alexandre apenas sorriu ao ver o empenho da rapaziada. Olhou para a repórter, que ainda caminhava em direção ao saguão dos elevadores e pensou como era uma boa atriz, ainda estava representando. O show não pode parar.

- E aí pessoal? Alguma novidade?

- Eu tenho algumas coisas - disse Gabriel.

- O que é?

- Acabei de ver todos os vídeos da ministra. A repórter aí aparece num monte de coisas.

- Deixa eu adivinhar ... nas orgias.

- Não só lá, tem em outros lugares também e com outras autoridades ...

- Já copiou pra mim e pra todo mundo? Ou vocês acham que me enganam?

Gabriel entrega um pen drive com os vídeos já editados para Alexandre.

- E o que mais?

- Aquela empresa de segurança, a Vukan, é bem interessante. Começou pequena na Áustria na década de 1970. Hoje, tem filiais grandes em Amsterdam, Zurique, Berlim e Moscou. Andaram metidos em algumas confusões relacionadas a espionagem industrial na área de aviação. Mas, no período Bush, entraram de cabeça na guerra contra o terrorismo e passaram a se associar a serviços secretos por toda a Europa. Dizem que fazia o serviço sujo para que os governos não se comprometessem. Também surgiram processos por negócios no mercado negro de armamentos. Os caras são barra pesada.

- Muito bom Gabriel. A coisa está começando a clarear, mas vamos precisar de um tipo de informação que não temos como conseguir aqui. Pablo, liga para os caras do Café & Conversa e marque uma reunião amanhã lá na Grenat. Rômulo, acompanhe discretamente os passos dessa jornalista Mércia Trancoso.

- Beleza! - gritou Rômulo.

- Se deu, hein?!?! - disse Pablo.

No dia seguinte, Alexandre e sua equipe chegaram adiantados ao encontro com os jornalista do Café & Conversa. Como era cedo, a cafeteria estava vazia. Apenas os policiais e alguns funcionários, além das proprietárias Luciana e Gabriela correndo de um lado para o outro.

- Acho que a repórter seguiu o seu conselho, Alexandre - falou Rômulo.

- Por que?

- Ela foi falar com o Brochado e a conversa foi demorada ...

- Será?

- Com esse nome ... - riu Pablo.

- Vai ver ele andou fazendo reposição hormonal ... (risada geral)

- Não sei. Ela chegou lá duas horas depois que falou com você e ficaram umas duas horas também trancados lá no gabinete dele. Ainda não li os jornais hoje. Alguém leu?

- Eu não - disse Pablo.

- Nem eu - disse Alexandre.

- Eu também não, mas peraí ... - disse Gabriel já ligando seu MacBook Pro.

O jornal Notícias do Brasil trazia a manchete em letras garrafais: "Delegado sabe quem matou ministra Sueli Sandoval". Abaixo, a foto de Alexandre cobria meia página.

- Brochado filho de uma puta! - rosnou o delegado.

O primeiro tiro pegou de raspão no braço esquerdo de Pablo. O segundo explodiu o laptop de Gabriel. A rajada de AR-15 que veio em seguida já não atingiu ninguém porque estavam todos no chão, com as pistolas em punho e se protegendo como podiam atrás de mesas, sofás e colunas. Uma segunda rajada veio se juntar à primeira.

- São dois atiradores com fogo cruzado - gritou Rômulo.

- Pablo! Você está bem? - perguntou Alexandre.

- Tudo bem, pegou de raspão. Estou legal ...

- Gabriel! Tudo bem aí?

- Porra! Os sacanas acabaram com o meu Mac, porra!

- Só atirem se tiverem visada - alertou Alexandre.

As rajadas começaram a varrer o salão. As janelas e a porta de entrada explodiram em milhares de pequenos cacos que brilhavam na luz do sol da manhã. As funcionárias da cafeteria se esconderam deitadas atrás do balcão. As defesas que conseguiram, na verdade protegiam muito pouco diante do poder de fogo dos fuzis semi-automáticos, cuspindo 800 projéteis por minuto a uma velocidade de 975 metros por segundo. Estavam encurralados.

♦♦♦

Como diz a nossa leitora lá da roça, @marvenbraga: "Eita!". O que é isso minha gente? Um atentado de enormes proporções e consequências imprevisíveis? Em que vespeiro o delegado Alexandre mexeu? E agora? Será que é o fim? O delegado e sua equipe estão encurralados e a artilharia é pesada. E as meninas da Grenat? Vão sobreviver? A Blog-Novela acabou? Vamos ter impunidade geral e irrestrita? A velha pizza requentada de sempre?

Me ajudem! Façam justiça! Enviem suas sugestões! Não nos deixem sós! Pelo menos até o próximo capítulo : )

E como nos deseja o Romoaldo todas as manhãs, de segunda a sexta-feira, em nosso quadro na CBN Recife e, em seguida, aqui no nosso podcast: Um abraço e bom café!

Um comentário:

AkiNaRoçaÉAssim disse...

Quando eu parar de rir, pode ser que eu pense em alguma coisa pra comentar... kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk...

Marven, a da roça!