sexta-feira, 22 de julho de 2011

Morte na Esplanada - Capítulo 15


Ricardo Icassatti Hermano

A nossa Blog-Novela agora entra em ritmo acelerado. As coisas esquentaram um pouco, a violência pesou, mas é inerente a esse tipo de investigação. Além disso, sou fã declarado do Quentin Tarantino : ) O delegado Alexandre Dantas será apresentado ao amigo da dupla do Café & Conversa e pode ser a chave para a solução do assassinato da ministra Sueli Sandoval, a famigerada SS.

Então deixemos de churumelas e lenga-lenga. Passemos diretamente para a sua caneca fumegante, o seu pijama, as suas meias e o seu edredon. Liguemos o som do seu computador, apaguemos as luzes e entremos no mundo sinistro da política e seus interesses nada republicanos. Som na caixa e arrepie-se!!!




Morte na Esplanada

Capítulo 15

O delegado Alexandre Dantas estava sem ação diante da inusitada cena de um Padre, em sua batina preta, dançando o mais genuíno Rock'n Roll dentro do estúdio de uma rádio. Mas, ficou estupefato mesmo quando viu a placa sobre a mesa, onde estava se lia: "Vive la mort, vive la guerre, vive le sacré mercenaire". Esse é o lema dos mercenários, os soldados da fortuna, os especialistas em missões impossíveis.

- O que está acontecendo aqui? Que Padre é esse? - pensou Alexandre.

- Você deve estar um tanto confuso agora, delegado. Deve estar se perguntando o que está acontecendo e quem é o nosso amigo Padre. Mas, não se preocupe. Assim que ele sair dali, vamos conversar e você vai entender tudo - disse Kassatti.

- Vocês também lêem pensamento?

- Às vezes, delegado. Só quando é preciso (risos).

O Padre terminou de dançar junto com a música. Pegou o microfone com uma mão, levantou a outra em direção ao teto e disse com voz rouca:

- Vocês acabaram de ouvir Bachman Turner Overdrive, com um dos seus maiores sucessos "Taking Care of Business". E assim, vamos encerrando o programa Jornadas do Dinossauro de hoje. Obrigado pela companhia e até amanhã, se Deus assim permitir. Paz e amor! Tchau!

O assistente de estúdio colocou a vinheta do programa. O Padre tirou o headphone e só então viu que o esperavam do lado de fora. Sorriu ao reconhecer os amigos do Café & Conversa e acenou. Arrumou alguns CDs, mexeu no computador, colocou seus óculos escuros, devido a uma fotofobia que o acompanha desde a adolescência, e saiu do estúdio.

- A que devo tão honrosa visita? Faz tempo que não vejo vocês, por onde andam?

- Padre Avellar, como vai? - disse Romoaldo.

- Um pouco mais velho, mas estou ótimo. E você Kassatti? O que anda aprontando?

- Pára com isso Padre ... continuo o mesmo pecador de sempre (risos).

- A essa altura, você já deveria saber que não existe pecado no amor, mas está precisando de aconselhamento (risos)?

- De certa forma, mas não para mim. Esse aqui é o delegado Alexandre Dantas. Ele é o responsável pela investigação do assassinato da ministra Sueli Sandoval e precisa da sua ajuda.

O Padre Avellar assumiu um ar sério e compenetrado.

- Sei ... eu li nos jornais sobre o atentado que você e sua equipe sofreram e só agora, vendo vocês todos juntos, entendo como conseguiu escapar. Estão todos bem?

- Felizmente, só um dos agentes ficou levemente ferido. Tivemos uma ajuda providencial dos amigos aqui, Padre - disse Alexandre.

- Vamos até a minha sala.

- Você ainda tem aquela cafeteira French Press que lhe demos de presente? - perguntou Romoaldo.

- Ainda tenho, mas o café ...

- Não se preocupe, eu trouxe um presente.

Romoaldo tirou da mochila dois pacotes de 500g de café colombiano, grãos da variedade Geisha. O Padre abriu um sorriso de orelha a orelha.

- Deus ouviu minhas preces (risos).

- Ele não ouve sempre? - brincou Romoaldo.

- Sempre, Ele sempre ouve. Mas, vocês só podem estar de brincadeira. Isso é quase um suborno (risos).

- Cadê a French Press?

O perfume de jasmin preencheu toda a sala quando a água quente foi derramada sobre os grãos recém-moídos. Enquanto aguardavam salivando os quatro minutos para completar a infusão do café, deram início à conversa. O Padre Avellar pediu informações sobre o caso e Alexandre lhe entregou um dossiê que havia preparado para o encontro. Ele folheou rapidamente, fazendo algumas pausas em determinadas partes. Depois fechou a pasta e devolveu ao delegado.

- O que exatamente você quer saber delegado?

- Eles me disseram que o senhor conheceu a ministra nos tempos da clandestinidade. Minha investigação chegou a um ponto em que qualquer informação pode ajudar. A partir de um determinado momento, passamos a tatear no escuro. A ministra aprontou muito e muita gente tinha medo dela pelas informações que possuía. Mas, não acredito que ela tenha sido morta por causa disso. Ela sabia jogar com essas informações de modo que todo mundo saísse satisfeito, usando como freio político para controlar aliados e opositores.

- Se ela não foi morta por causa disso - e nisso concordamos - você supõe que tenha sido porque ...

O café foi servido em doses generosas. Canecas expelindo um suave e cheiroso vapor, trouxeram algo de cerimonioso ao ambiente.

- Acredito que ela estivesse envolvida em algo diferente desse métier de corrupção política, compra de votos, cargos etc. Isso sempre fez parte de qualquer governo, em maior ou menor grau, conforme o medo de perder o poder. Tem que ser outra coisa.

- Delegado, você não está totalmente certo nem totalmente errado. Precisa apenas rearranjar o raciocínio. O motivo será sempre o mesmo, porque o ser humano é o que é. O que você está procurando é o mesmo, só que maior, muito maior, tão grande que conseguiu unir todas as forças contra ela. A ministra se tornou um perigo assustador demais, a ponto de não sobrar alternativa que não fosse matá-la.

- Mas, o que poderia ser tão grande assim? Maior que o governo?

- Maior que os projetos de poder de vários grupos.

- Aliados e oposição?

- Mais ...

- Mais? De onde?

- Delegado, não fui Padre a minha vida inteira. Antes disso, ainda bem jovem, tentei a carreira militar. Mas, as condições no Brasil ... você sabe. Assim, me desliguei das Forças Armadas e fui correr o mundo. Quando cheguei à África do Sul, recebi e aceitei um convite para trabalhar como "consultor" da Executive Outcomes, empresa de segurança privada baseada em Pretória. Não larguei mais a "carreira".

- Eu vi a placa lá no estúdio.

- Na verdade, aquela frase foi copiada de um lema da Legião Estrangeira e foi usada no filme Cães de Guerra, de 1981, com um final diferente. A frase original diz: "Vive la mort, vive la guerre, vive la Légion Etrangère".

- Então você foi mercenário mesmo?

- Não gosto muito do termo. O cinema criou um mito bobo. Prefiro soldado ou profissional da guerra, especializado em intervenções militares rápidas e contra espionagem. Cumpria missões. Lá na Executive Outcomes eu conheci esse Gaston Perrin. um tipo perigoso. Por várias vezes, colocou em risco os próprios companheiros e foi dispensado. De lá, ele foi trabalhar na Vukan, que usa muito esse tipo de ... especialista. Até então, não tinha mais notícias dele. Virou assassino profissional, pelo que vi. Parece que nessa atividade, ele se deu bem. Talvez por trabalhar sozinho.

- Ele era bom em algumas coisas, como a coisa do veneno e os disfarces. Ele nos despistou várias vezes.

O Padre deu uma gargalhada. Não quis polemizar com o delegado, pois sabia que a polícia jamais poderá superar um especialista treinado em táticas de guerra e sobrevivência em condições totalmente adversas. O assassino profissional é treinado em artes que a polícia sequer desconfia.

- Lutei em vários países africanos, fui até condecorado. Trabalhei muitos anos com os israelenses e lutei na América Latina, incluindo a Nicarágua, onde participei mais intensamente da área de inteligência e informações. Foi quando conheci a Sueli Sandoval, ou SS, como era chamada. Na época, ela era bem jovem e parecia ter um certo fervor ideológico. Era muito inteligente e não era muito afeita aos exercícios físicos e ao combate. Logo se destacou no treinamento de contra espionagem, pois identificou ali uma fonte imensa de poder. Hoje, sabemos que era só o que ela e sua turma queriam. Mas, ela também se interessou muito pelas finanças das guerrilhas, onde estavam as fontes do dinheiro para a compra de armas, custo de operações, esconderijos, documentação falsa, essas coisas. Cuba tinha levado um calote das "esquerdas" brasileiras e não financiava mais nada. Sueli então teve a ideia de buscar dinheiro no Oriente Médio. Líbia e OLP passaram a injetar muita grana naqueles grupos e, depois, partidos políticos.

- Deve ser por isso que esses países e outros daquela região transitam com tanta desenvoltura por aqui e ditadores são chamados de "irmãos" pelo presidente - pensou alto Alexandre.

- É por aí. Eles têm uma conta enorme pendurada no gancho e estão cobrando. O importante é que foi nesse trâmite da grana que a Sueli conheceu um outro sujeito que também ajudava no treinamento de obtenção de informações. Era um francês, comunista, que entendia muito de finanças internacionais, procedimentos bancários etc. Tinha muitos contatos nessa área. Os dois chegaram a ter um caso, eu diria, intenso. Os dois tinham, digamos, muitas semelhanças na área sexual ...

- E quem era esse francês? Era o Gaston?

- Não (risos)! O nome dele era Dometien Salaun Klein. A Sueli chamava ele de DSK. Era a dupla DSK e SS. Eles até usaram isso como código.

- O presidente de banco que está preso em Nova Iorque?

- Esse mesmo. Mundo pequeno, não?

- Mas, o que ele teria a ver com o assassinato da Sueli?

- Ele? Pouco ou nada. Mas, devem ter alguma conexão. Ele e ela estavam no poder em seus respectivos países. Os dois são especialistas em finanças internacionais. Os dois são ambiciosos. Basta ligar os pontos.

- Então os dois estavam envolvidos em alguma coisa muito grande ...

- Vocês viram uma entrevista coletiva dos presidentes do Brasil e da França há uns seis meses? O presidente francês fez uma visita estranha aqui, tipo relâmpago e sem uma agenda política que justificasse o esforço diplomático. Mas, aí o presidente brasileiro tomou umas a mais e deu com a língua nos dentes. Perguntado sobre a licitação para compra de aviões caça, ele disse que já tinha decidido que os caças franceses Rafale eram os vencedores. E a licitação ainda estava acontecendo. Aliás, nunca entendi como o Ministério Público Federal ou o Congresso Nacional nunca tomaram qualquer providência contra o crime de prevaricação cometido pelo presidente em rede nacional de televisão ao vivo.

- Eu me lembro dessa entrevista e me fiz a mesma pergunta. Todo mundo se fez de surdo e cego. Soltaram umas notas oficiais ridículas, a licitação voltou atrás e está indefinida até hoje.

- O governo francês tem um grande interesse em revigorar sua indústria de armamentos, especialmente a de aviação, mas esse avião Rafale é um fiasco. Já caíram dois no Sudoeste da França quando voavam em teste e outro no Paquistão. O Brasil é a bola da vez na economia mundial e tem muitos bilhões para gastar na modernização e reaparelhamento das Forças Armadas. Vocês podem imaginar a briga de foice. A França já vendeu para o Brasil submarinos totalmente ultrapassados e fechou contrato de 1,8 bilhão de Euros para a compra de helicópteros. Se dois presidentes se dão ao trabalho de firmar compromisso sobre contratos de bilhões é porque a coisa é séria. Alguém estava sonhando com uma comissão gorda e alguém estava querendo se meter no negócio.

- Você acha que esse seria o motivo?

- Estamos apenas raciocinando, mas é uma hipótese bem plausível, não?

- Seria, mas ...

- Delegado, você não conseguirá responder a todas as perguntas e solucionar todos os mistérios. Contente-se em descobrir o motivo do assassinato da ministra e deixe as outras tramas para outros investigarem. Até porque, o pouco que você já mexeu quase lhe custou a vida.

A segunda leva de café terminou e a conversa também.

- Meus amigos, foi bom vocês terem vindo hoje aqui.

- Por que? - perguntou Romoaldo.

- Estou de partida do Brasil. A minha Congregação vai se reunir em Roma e vocês sabem como esse tipo de reunião é longa. Pelo menos seis meses. E eu vou participar de um Capítulo também.

- Capítulo? O que é isso? - perguntou Kassatti.

- É um curso sobre Direito Canônico.

- Você está sendo preparado para alguma coisa?

- Após esse Capítulo, estarei apto a ser o Provincial da minha Congregação no Brasil.

- Uau! Está subindo na vida, hein Padre Avellar!

- Espero que em direção ao Paraíso, meus amigos (risos). Mas sei que, se for confirmado mesmo, assumirei uma cruz pesada ...

- Boa sorte então!

Alexandre se despediu do Padre Avellar e pensou como era fascinante a vida daquele homem. Não resistiu e perguntou.

- Padre, uma última pergunta.

- Faça, delegado.

- Como se deu essa transformação de soldado a Padre?

- Na verdade, não me sinto muito afastado da minha especialidade. Continuo um soldado, agora um soldado de Deus. Continuo usando meus conhecimentos de estratégia e de contra espionagem. Você sabe que a Igreja não é um grupo de escoteiros. O que mudou foram as armas. Não vi mais sentido na destruição e me voltei para a construção. Para isso, era preciso mudar também a sintonia para o amor e foi na fé em Deus que consegui encontrar esse novo "armamento". Agora luto com outros propósitos. Ainda quero construir um mundo melhor, mas sem destruir nada, apenas transformar.

- E a rádio especializada em Rock'n Roll?

- Ah ... o Rock é a trilha sonora da minha vida. Mas, é o Rock dos bons tempos.

O delegado foi obrigado a concordar que a música era a trilha sonora perfeita para aquele Padre inusitado. Ele e a dupla do Café & Conversa saíram da rádio.

- Bem, delegado, acredito que agora você tem as informações necessárias para tirar a sua investigação do beco sem saída em que se encontra - disse Kassatti.

- Tive uma boa ideia de qual caminho seguir. Quero agradecer a ajuda de vocês e retribuir de alguma maneira.

- Não se preocupe delegado. Um dia poderemos entrar em contato e lhe pedir um favor como esse que você acabou de receber. Talvez você precise conversar com alguém e dar alguma informação. Nada ilegal ou que o comprometa profissionalmente. Apenas ajudar alguém a seguir adiante - explicou Romoaldo.

- Sem problema. Estou ao dispor de vocês.

- Então, é aqui que nos despedimos. Desejamos boa sorte na sua investigação e se precisar da nossa ajuda, sabe onde nos encontrar.

Alexandre saiu animado, mal podia esperar chegar ao escritório e reunir a equipe. Graças às informações do Padre Avellar, ele agora sabia quais passos seriam necessários para elucidar o assassinato da ministra.

- Pessoal, tive uma reunião esclarecedora com um amigo dos caras do Café & Conversa. Já sei o que precisamos fazer e onde procurar pistas. Gabriel, pegue todo o material que temos daqueles pen drives da ministra e reparta em quatro partes. Cada um de nós vai passar um pente fino naquilo tudo e ver se acha esse sujeito ou qualquer referência a ele.

Alexandre apontou a foto estampada no jornal de Dometien Salaun Klein algemado e sendo conduzido por policiais para a prisão em Nova Iorque.

- Procurem também por qualquer referência a "DSK", as iniciais do nome desse cara.

♦♦♦

Será que agora o delegado Alexandre Dantas conseguirá a pista que vai levar à solução da misteriosa morte da ministra Sueli Sandoval? Qual é o papel de Dometien Salaun Klein nessa trama diabólica? O que mais nos reserva esse caso?

Respondam vocês : ) Deixem suas críticas, sugestões, dicas, sacadas e comentários. Apontem direções e possíveis soluções. Estamos aguardando e sempre lembrando que, apesar de tudo o que temos visto nos últimos nove anos, essa Blog-Novela é apenas e tão somente uma obra de ficção científica ... Hahahahahahahaha!!! (risada do Vincent Price)

"Não perca a cabeça, delegado ..."

E como nos recomenda o Romoaldo todas as manhãs, de segunda a sexta-feira, em nosso quadro na CBN Recife e, em seguida, aqui no nosso podcast: Um abraço e bom café!

Links dos capítulos já postados. Basta clicar no capítulo desejado:















2 comentários:

Anônimo disse...

O padre é fascinante. Et vive le sacré mercénaire. Mercenárioo+Rock é hard.
Bom, O fato é que Sueli podia melar a grande negociação e a mais alta autoridade francesa parece que não gostou. Obviamente um "oui, oui" daqueles bem baba-ovo, sabendo das fraquezas da SS mandou matá-la para agradar o chefe. Pior, jofou a culpa em DSK. Absolutamente brilhante a idéia. O mercenário melou.
Os capítulos estão numa "velocidade estonteante". Que tal aquela jornalistazinha aparecer amarrada e nua na frente da Catedral, vingança de um chefão da Federal? Perida o emprego e a maquiagem ainda ia escorrer. Sem contar o cabelo desabado. Seria um bom final para a mocinha de jornada dupla.
Está ótimo.
Memélia

AkiNaRoçaÉAssim disse...

'Um profissional da guerra cansado da destruição e que se volta para a construção' não diz tudo, mas resume bem a personagem do Padre Rock'n Roll.
E nem com a entrada de um "francês" pode-se dizer ao certo que, nesse caso, a arte imita a vida.

Nessa terra de gigantes, "mermão", até de um nobre padre desconfio.
Sei não... (rs)

Marven de Marvênia.