quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Expedição ao Monte Roraima - Parte 2

Ricardo Icassatti Hermano

O dia amanheceu com sol e gelado. Rosinha e eu tivemos a brilhante ideia de deixar as toalhas e algumas peças de roupa para secar penduradas do lado de fora da barraca. Apesar de ser uma savana com solo tão pobre que só dá para os índios cultivarem mandioca, a umidade é de selva tropical. 

Nossos dias começavam e terminavam cedo

Tremenda contradição ambiental que levou pelo menos um ambientalista a pagar mico internacional ao acusar o Brasil de ter "desmatado" o estado de Roraima ... O resultado é que nossas toalhas e roupas estavam mais molhadas do que quando as penduramos para secar. 

Terra pobre e difícil de andar

O café da manhã da manhã seguiu o padrão do jantar da noite passada. Muito carboidrato para dar energia e proteína para alimentar os músculos. Trash food altamente calórica. O bom é que o exercício puxado queimava tudo e algo mais. Meu cinto apertou dois buracos. Ainda não tínhamos ideia do que iríamos enfrentar nos próximos nove quilômetros de caminhada até o acampamento base. 

Esse foi o trecho fácil ...

O terreno acidentado é marcado pela travessia de dois grandes rios, além  de subidas e descidas íngremes, longas. Como temos ritmos diferentes, sempre me distancio da Rosinha e chego primeiro. Mas, um guia segue à frente e outro no final da fila. Ninguém se perde. Tenho que agradecer às aulas de Yoga. A caminhada ficou mais fácil ao trocar a respiração curta da cidade pela respiração longa, que diminui os batimentos cardíacos e supre de oxigênio os músculos das pernas.

Esta senhora índia sorriu e me disse algo no seu idioma
Acho que que me desejou uma boa jornada

Apesar das dificuldades e talvez até por conta delas, o grupo foi se aproximando nas ajudas possíveis e necessárias, quebrando resistências que nascem sabe-se lá como ou porquê. Estávamos na mesma canoa e o sucesso da nossa empreitada dependia da colaboração e da tolerância de todos. Além disso, a humanidade está numa canoa um pouco maior, chamada planeta Terra. É sempre bom lembrarmos disso.

Rosinha segue em direção ao Roraima e à chuva

O acampamento base não dá nem para chamar de acampamento. Charco seria mais apropriado. O bom é que as barracas estão sempre montadas quando chegamos, embora de maneira aleatória e sobre a lama. E chegamos debaixo de uma chuva que nos acompanhou por quase toda a trilha. Estávamos exaustos, sujos e famintos. As primeiras bolhas apareciam em alguns pés. Os meus ainda estavam intactos, mas muito doloridos pelo castigo do terreno irregular. 

A lona azul é o nosso rancho, o paredão é o Roraima

Ao tirar as botas para tomar um banho gelado no rio, descobri que a unha do dedão do pé esquerdo havia quebrado com o esforço da caminhada e pela pressão dos dedos contra o bico da bota. Tudo indicava que o modelo da minha bota não era o mais adequado para aquele tipo de caminhada. Mas, agora era tarde e vou perder essa unha. 

Mais uma visão geral do acampamento base e as meninas
se preparando para tomar banho no rio

Vesti sandálias e fui para o rio. Lá chegando, vi uma pequena piscina ideal para um banho, só que estava uns dois metros abaixo. Ao descer, meu esquerdo escorregou no limo e desceu entre duas pedras. Meu primeiro ferimento foi um corte no tornozelo. Precisaria levar uns dois ou três pontos cirúrgicos, mas como? Bandaid, iodo e esparadrapo deram conta do recado. Eu ainda tinha que escalar o Roraima para recuperar minha alma e não seria um corte qualquer que me impediria. A sorte é que a água do rio estava tão gelada que o sangramento foi imediatamente estancado e os pés ficaram anestesiados. 

Meu primeiro ferimento

Nossa barraca tinha um riacho bem na porta. Os índios haviam capinado uma área para montar o rancho, onde fica a cozinha do acampamento. Peguei o capim cortado e fiz um tapete na entrada da barraca, isolando a água. Assim, garanti um interior limpo e seco. quando Rosinha chegou, as nossas mochilas e os isolantes térmicos já estavam instalados.

Nossa barraca com o tapete de capim sobre o riacho
Esse solzinho foi a maior enganação

Um aspecto curioso é que os índios permitem esse tipo de turismo num local que consideram sagrado. Porém, impõem exigências como a não existência de bancos para sentarmos. Se quisermos comer sentados, precisamos procurar um monte, uma pedra ou uma árvore caída. Os índios querem que o turismo seja em condições absolutamente selvagens. Todo o lixo e dejetos que produzimos são recolhidos e levados de volta. A única coisa que podemos levar de lá são as fotos e os vídeos que fizermos.

O grupo acabou de jantar. Logo veio uma tempestade
e todo mundo foi dormir.

A noite chegou rápido, com muito vento e chuva. Nada de conversa após o jantar. Todos correram para as suas respectivas barracas e se enfiaram nos seus sacos de dormir. No dia seguinte iríamos escalar o paredão do Monte Roraima. Do acampamento base até o chamado "Hotel Guacharo" seriam mais 6,5 quilômetros, sendo um quilômetro totalmente vertical. 

Amanhã eu conto mais.

2 comentários:

Raquel disse...

Sensacional. Quero saber o fim da história para convencer o Caiã a encararmos essa.
Espero que seu primeiro ferimento já tenha cicatrizado.
Abraço
Raquel

Café & Conversa disse...

Vocês vão gostar muito dessa aventura. Recomendo com nota 10! O ferimento está em processo de cicatrização e as dores quase no fim : )